A Vila, como todas as pequenas vilas de Portugal, estava engalanada com tudo o que de melhor tinha para oferecer. Estavam na rua os Bombeiros, a Banda, o Rancho, a Confraria, porque a Casa do Passal, ou a casa do Sr. Doutor tal como os antepassados dos que estavam na rua conheciam, aquela que todas as semanas se abria para oferecer refeições aos mais pobres ou que, durante a guerra, tantos refugiados acolheu, estava reconstruída e ia ser, de novo, aberta à comunidade.
Olhar para a fachada daquela casa, agora museu, daquela família tão especial, a quem todos tanto devemos, e sermos recebidos pelo seu neto Dr. António Pedro Moncada, que tão gentilmente nos endereçou o convite, relembrou-nos a enorme responsabilidade que o Presidente da República tão bem definiria na abertura das comemorações: “O Museu de Aristides de Sousa Mendes é lição para o futuro, isto é um museu, que não é local, nem regional, nem nacional. É universal. Este museu diz-nos a todos nós, que aqui estamos, que a luta de Aristides de Sousa Mendes não terminou, começa todos os dias e essa é a lição que ele nos deixa”.
O Presidente da Câmara Municipal de Carregal do Sal, Paulo Catalino, frisou, durante a sessão solene, que, além do Presidente da República, contou ainda com a ministra da Cultura, Dalila Rodrigues, o Secretário de Estado das Comunidades, José Cesário, e o Secretário-Geral do PS, Pedro Nuno Santos, descendentes do diplomata a refugiados que salvou, embaixadores de França, Luxemburgo, Estados Unidos da América, Bélgica, Áustria, Alemanha e Israel, assim como representantes de Câmaras onde Aristides de Sousa Mendes foi cônsul, que a inauguração da Casa-Museu de Aristides Sousa Mendes é “o justo momento de reposição da dignidade e da memória de um homem que teve a lucidez, arrojo e coragem de salvar vidas”. “Com esse gesto, teve a plena noção de que, da sua decisão, a vida dos seus mais diretos muito sofreria, deixando-nos seguramente um dos mais belos exemplos de altruísmo e humanidade do século XX”, acrescentou. Por isso a casa Museu é o espaço de educação e formação, conhecimento e exaltação de valores humanitários
Também António Guterres, Secretário-Geral das Nações Unidas, presente na cerimónia em mensagem de vídeo, pediu-nos que “Assumamos o compromisso de defender os direitos humanos e a dignidade para todos e de combater a discriminação, a intolerância e o ódio”. Esta inauguração do Museu, lembrou, “acontece num momento crucial, porque hoje o nosso mundo é perigoso e está dividido. O número de pessoas forçadas a abandonar as suas casas atingiu um nível recorde”.
Para perpetuar, de outras formas, a vida daquele que “Escolheu salvar vidas” foi também adquirida a Casa do Aido, local onde nasceu Aristides de Sousa Mendes, para aí instalar um centro de acolhimento de refugiados, porque, como acrescentou o Secretário-Geral das Nações Unidas, “Corremos o risco de esquecer a nossa humanidade partilhada”, por isso “Deixemo-nos inspirar pela sua memória, ganhemos coragem com o exemplo da sua bravura, bastião de coragem, de compaixão e de convicção, no mundo em total colapso moral”.
Era visível o orgulho das quase duas centenas de filhos, netos, bisnetos, trinetos e outros familiares de Aristides, bem como de descendentes de refugiados a quem o cônsul concedeu o visto que lhes permitiu passar por Portugal a caminho de outras paragens mais seguras.
Para nós, foi impossível não questionar como foi possível esperar mais de oitenta anos por este momento quando Aristides de Sousa Mendes decidiu, depois de três dias de “uma enorme luta interior”, como conceder os vistos a quem deles necessitava. Fez o que a sua consciência lhe ditou, fundada nas suas profundas convicções de cristão, aliando o conhecimento teológico e bíblico a uma profunda espiritualidade, como também recordou o neto António Moncada Sousa Mendes: “Mesmo que me destituam, só posso agir como cristão, como me dita a minha consciência; se estou a desobedecer a ordens, prefiro estar com Deus contra os homens do que com os homens contra Deus.”
Também o Papa Francisco enviou uma mensagem especial para ser lida: “Uno de coração para beber o legado de um homem justo é reconfortante fazer memória da liberdade da sua consciência bem formada, alicerçada na defesa da dignidade da pessoa humana". Nos dias de hoje, referiu, "são testemunhos de fraternidade como deste diplomata português" que "encorajam" e não deixam perder a esperança. "Na verdade, também diante de nós se continuam a abrir sendas de resgate e caminhos de salvação. Queira Deus que não nos falte a coragem de os percorrer, sobretudo se se revelarem insuficientes as vias de encontro e os trilhos de diálogo", desejou. O Papa Francisco terminou a carta "agradecendo ao Senhor e juiz da história os luminosos sinais de cada homem e mulher e boa vontade" e a "implorar do céu abundantes graças divinas sobre todos os participantes" na inauguração do Museu.
Assim, possamos nós continuar no CIC, junto dos nossos alunos, a exaltar pelo exemplo de figuras como Aristides Sousa Mendes, não só a fidelidade, mas também a efetiva defesa dos valores Claretianos de que a Humanidade tanto necessita.
As professoras Anabela Vaz Pinto, Maria José Fontes, Maria José Queirós e Paula Oliveira