“A fé é o pássaro que sente a luz quando a alvorada ainda está escura.”
(Tagore)
Mas de que forma pode a fé contribuir para o nosso desenvolvimento integral e influenciar a nossa saúde?
A fé e a espiritualidade sempre fizeram parte da experiência humana, pois temos predisposição biológica para as crenças, contudo, nos últimos anos, a ciência tem demonstrado, com mais clareza, como esses elementos podem influenciar, positivamente, a saúde física e mental. Estudos em diferentes áreas da medicina e da psicologia têm vindo a confirmar que a prática religiosa e a espiritualidade não são apenas expressões culturais ou emocionais, mas são também fatores de proteção para o bem-estar.
Investigações, publicadas no “Journal of Behavioral Medicine” e no “American Journal of Psychiatry”, defendem que pessoas que cultivam a fé apresentam menores índices de depressão, ansiedade e consumo de substâncias ilícitas. A fé funciona, nestes casos, como um apoio fundamental: oferece sentido à vida, ajuda a enfrentar melhor as dificuldades e fortalece a resiliência perante adversidades, reduzindo também a sensação de isolamento social.
Do ponto de vista físico, há evidências de que a fé pode impactar, positivamente, os sistemas imunitário e cardiovascular. Um estudo realizado pela “Harvard Medical School” mostrou que pessoas, que participavam regularmente em práticas religiosas, diminuíam, em 33%, o risco de morte precoce. Os investigadores destacam que a fé promove hábitos mais saudáveis, redes de apoio comunitário e práticas, como a oração e a meditação, estudadas há décadas, que ajudam a reduzir os níveis de stresse e de cortisol, hormona relacionada com inflamações e doenças crónicas. Pesquisas em neurociência demonstram que estes exercícios ativam áreas do cérebro relacionadas com o autocontrolo, a empatia e o bem-estar, além de contribuírem para a redução da pressão arterial e a melhoria da qualidade do sono. A espiritualidade, neste sentido, atua como uma espécie de “colchão psicológico” contra o impacto das tensões do dia a dia.
É importante, no entanto, salientar que a fé e a espiritualidade não substituem tratamentos médicos ou terapêuticos. Funcionam como um complemento, ampliando a força interior e favorecendo uma visão mais positiva da vida, o que, por sua vez, se reflete em melhores indicadores de saúde. Além disto, é igualmente importante reconhecer que a fé nem sempre é vivida de forma positiva. Dependendo do contexto e da intensidade, também pode ter efeitos negativos na saúde.
Um dos aspetos mais estudados é o sentimento de culpa. Em tradições religiosas muito rígidas, algumas pessoas sentem-se constantemente julgadas ou indignas, o que aumenta o risco de ansiedade e depressão. Há também situações de conflito espiritual, quando alguém acredita estar a ser castigado por Deus ou sente que perdeu o sentido da sua fé. Esse sofrimento espiritual está associado a maior angústia psicológica e a piores indicadores de saúde mental.
Outro risco surge quando a fé leva à recusa de cuidados médicos. Há comunidades ou indivíduos que rejeitam tratamentos, vacinas ou terapias, confiando apenas na intervenção divina. Esta escolha pode ter consequências graves, sobretudo em doenças crónicas ou emergências. Além disso, em contextos religiosos muito fechados, pode ocorrer exclusão social ou pressão para seguir normas que limitam a liberdade pessoal, com impacto negativo na autoestima e no equilíbrio emocional. Por fim, a radicalização de crenças pode transformar a fé em fonte de medo ou de conflito, tanto a nível familiar como comunitário. Quando a espiritualidade se torna fanatismo, deixa de ser um recurso de saúde para se tornar um fator de risco.
Assim, a fé pode ser uma poderosa aliada da saúde, mas também um desafio, quando vivida de forma extrema ou conflituosa. O equilíbrio é fundamental: práticas espirituais que promovem compaixão, apoio comunitário e sentido de vida tendem a beneficiar o bem-estar. Já formas de religiosidade marcadas por culpa, isolamento ou recusa de cuidados médicos podem comprometer a saúde. Reconhecer ambas as perspetivas permite-nos construir uma visão mais completa da relação entre a fé e a saúde.
Prof.ª Isabel Cristina