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O Curso de Assessoria Jurídica e Documentação vai retomar, a exemplo de
anos anteriores, a rubrica habitual” AJ Esclarece”. Embrenhados que
estamos na participação no programa “Faça-se Justiça” seria de toda a
utilidade começar por lançar alguns temas ligados ao Processo Penal
respondendo às hipotéticas questões mais frequentes nesta especifica
área do Direito.
Simultaneamente, e dada a interactividade do
novo formato da página do Colégio, vamos tentar responder a algumas
questões que, eventualmente, nos queiram entretanto colocar, dentro da
disponibilidade possível.
Fase obrigatória de investigação que se inicia
sempre que há notícia da prática de um crime

O que é o inquérito?
R: Primeira fase do processo penal, onde se faz
a investigação e recolha de provas sobre a existência de um crime e as
pessoas que o praticaram; a direcção do inquérito pertence ao Ministério
Público auxiliado pelas polícias.
Qual é a duração máxima do inquérito?
R: Em regra, o Ministério Público encerra o
inquérito, arquivando-o ou deduzindo acusação, nos prazos máximos de
seis meses, se houver arguidos presos ou sob obrigação de permanência na
habitação, ou de oito meses, se os não houver.
O que é um crime?
R: Comportamento voluntário do qual resulta a
violação de normas penais - contidas no Código Penal ou em legislação
avulsa - que visam proteger e salvaguardar os bens jurídicos
fundamentais à sobrevivência da sociedade, como por exemplo, a vida, a
integridade física e o direito de propriedade.
O que significa notícia do crime?
R: Informação de que foi praticado um crime;
para que o Ministério Público possa iniciar o processo penal é
necessária esta informação que pode ser obtida por modos diversos: por
conhecimento próprio, por intermédio dos órgãos de polícia criminal ou
através de denúncia.
O que é um auto de notícia?
R: Documento elaborado pelos juízes,
magistrados do Ministério Público ou pelas polícias, sempre que tenham
presenciado qualquer crime de denúncia obrigatória; dá início a um
processo de investigação.
O que são autoridades judiciárias?
R: São autoridades judiciárias o juiz, o juiz
de instrução e o Ministério Público.
O que se entende por Ministério
Público?
R: Entidade, formada por um corpo de
magistrados, que exerce a acção penal: recebe as denúncias e as queixas,
dirige o inquérito, elabora a acusação, arquiva e interpõe recursos.
Em que consiste um crime público?
R: Crime cujo processo de investigação se
inicia independentemente da vontade da vítima do crime; pode ser
denunciado por terceiros e não exige que seja a vítima a apresentar a
queixa pessoalmente.
O que se entende por crime
semi-público?
R: Crime cujo processo de investigação se
inicia apenas após a apresentação de queixa pela vítima do crime.
O que é um crime particular?
R: Crime em que, para além do exercício do
direito de queixa, é necessário que o titular do direito se constitua
assistente, sem o que a acção penal não pode prosseguir.
Como apurar se determinado crime é
público, semi-público ou particular?
R: Deve atender-se à letra da lei: quando esta
nada diz, o crime em apreço é público; quando se preceitua que o
procedimento criminal depende de queixa estamos perante um crime
semi-público; quando a lei refere que o procedimento criminal depende de
queixa e de acusação particular, o crime é particular.
Qual é o significado de vítima?
R: Pessoa que, em consequência de acto ou
omissão violadora das leis penais em vigor, sofreu um atentado à sua
integridade física ou mental, um sofrimento de ordem moral ou uma perda
material; o conceito de vítima abrange também a família próxima ou as
pessoas a cargo da vítima directa e as pessoas que tenham sofrido um
prejuízo ao intervirem para prestar assistência às vítimas em situação
de carência ou para impedir a vitimação.
Sou vítima de crime. Com que
qualidade/estatuto poderei ir a julgamento?
R: Como testemunha indicada pelo Ministério
Público ou como assistente se assim se constituir no decurso do
processo.
O que é o ofendido?
R: É a vítima nos crimes públicos.
O que é o queixoso?
R: É aquele que exerce o direito de queixa,
tratando-se de um crime semi-público ou particular.
O que significa ser assistente?
R: É a vítima (ofendido/queixoso) do crime e
actua como colaborador do Ministério Público competindo-lhe,
designadamente: intervir no inquérito e na instrução (ex.: oferecendo
provas) e recorrer das decisões que o afectem.
O que é necessário para a constituição
como assistente?
R: A constituição como assistente implica o
pagamento de taxa de justiça e a constituição de advogado, sem prejuízo
da concessão do benefício do apoio judiciário.
Fui vítima de um crime. O que posso
fazer?
R: Pode denunciar o crime de que foi vítima em
qualquer esquadra de polícia, nos serviços do Ministério Público ou por
via electrónica. A denúncia não necessita de ser apresentada por
escrito, nem carece da intervenção de advogado. Estando em causa crimes
dependentes de queixa (crimes semi-públicos e particulares), a mesma tem
de ser apresentada no prazo de 6 meses a contar da data em que o titular
da queixa tiver conhecimento do facto e dos seus autores, sob pena de
extinção daquele direito.
Tem de ser a vítima a apresentar a
denúncia?
R: Essa exigência apenas se verifica no âmbito
dos crimes semi-públicos e particulares.
Relativamente aos crimes públicos, além da
própria vítima, pode ser um terceiro a apresentar a denúncia. No que
respeita aos crimes particulares é necessária, além da apresentação da
queixa, a constituição como assistente, o que implica o pagamento de
taxa de justiça e a constituição de advogado, sem prejuízo da concessão
do benefício do apoio judiciário.
O que é a denúncia?
R: Forma de comunicação do crime às autoridades
judiciárias; pode ser obrigatória ou facultativa.
Quando é que a denúncia é obrigatória?
R: Este dever de comunicação recai sobre as
entidades policiais (quanto a todos os crimes públicos) e sobre os
funcionários públicos, demais agentes do Estado e gestores públicos
(relativamente aos crimes públicos de que tomem conhecimento no âmbito
das suas funções).
E facultativa?
R: A comunicação não é obrigatória para as
demais pessoas não referidas na pergunta anterior e também relativamente
aos crimes de que os funcionários públicos, agentes do Estado e gestores
públicos tenham conhecimento fora das suas funções.
Em que consiste a queixa electrónica?
R: Trata-se de um sistema destinado a facilitar
a apresentação à Guarda Nacional Republicana, à Polícia de Segurança
Pública e ao Serviço de Estrangeiros e Fronteiras de queixas e denúncias
por via electrónica quanto a determinados tipos de crimes públicos e
semi-públicos: ofensa à integridade física simples; violência doméstica,
maus tratos, tráfico de pessoas, lenocínio, furto, roubo; dano; burla,
burla a trabalho ou emprego; extorsão; danificação ou subtracção de
documento e notação técnica; danos contra a natureza; uso de
documentação de identificação ou viagem alheio; poluição; auxílio à
imigração ilegal; angariação de mão-de-obra ilegal e casamento de
conveniência. Para crimes não abrangidos pelo Sistema Queixa
Electrónica, o cidadão deverá continuar a dirigir-se ou a contactar a
autoridade policial mais próxima.
Apresentei queixa mas agora pretendo
desistir da mesma. É possível?
R: Estando em causa crimes semi-públicos e
particulares, a desistência da queixa é admissível até ser proferida
sentença e desde que não haja oposição do arguido; a desistência impede
que a queixa seja renovada.
O que é um suspeito?
R: Pessoa sobre a qual recai a suspeita de ter
praticado um crime e que pode vir a ser constituída como arguida.
O que é o arguido?
R: Pessoa sobre a qual recaem suspeitas
fundadas de ter praticado um crime e a quem é assegurado o exercício de
direitos e deveres processuais após ter assumido essa qualidade.
Em que circunstâncias podem as
autoridades policiais pedir a identificação de um cidadão?
R: Os órgãos de polícia criminal podem proceder
à identificação de qualquer pessoa encontrada em lugar público, aberto
ao público ou sujeito a vigilância policial, sempre que sobre ela
recaiam fundadas suspeitas da prática de crimes, da pendência de
processo de extradição ou de expulsão, de que tenha penetrado ou
permaneça irregularmente no território nacional ou de haver contra si
mandado de detenção. Na impossibilidade de identificação, os órgãos de
polícia criminal podem conduzir o suspeito ao posto policial mais
próximo e obrigá-lo a permanecer ali pelo tempo estritamente
indispensável à identificação, em caso algum superior a seis horas. Será
sempre facultada ao identificando a possibilidade de contactar com
pessoa da sua confiança.
Em que consiste a detenção?
R: É uma privação da liberdade por um período
muito curto, com diversos fins: para, no prazo máximo de quarenta e oito
horas, o detido ser submetido a julgamento ou ser presente ao juiz
competente para interrogatório judicial ou aplicação de uma medida de
coacção; ou para assegurar a presença imediata do detido perante o juiz
em acto processual.
O que é o habeas corpus?
R: Meio de reacção processual contra uma
detenção ou prisão ilegais, com carácter de urgência.
O que são órgãos de polícia criminal?
R: Entidades que cooperam com as autoridades
judiciárias na investigação criminal e são: Polícia Judiciária (PJ),
Polícia de Segurança Pública (PSP), Guarda Nacional Republicana (GNR) e
Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF).
Em que consistem as medidas de coacção?
R: Meios que diminuem a liberdade processual
dos arguidos e que se destinam a tornar eficaz o processo penal, são:
termo de identidade e residência; caução; obrigação de apresentação
periódica; suspensão do exercício de funções, de profissão e de
direitos; proibição de permanência, de ausência e contactos; obrigação
de permanência na habitação e prisão preventiva. Tais medidas, com
excepção da primeira, só podem ser aplicadas por juiz.
Em que se traduz o termo de identidade
e residência (TIR)?
R: É a menos grave das medidas de coacção
podendo ser aplicada pelo juiz, pelo Ministério Público e pelas
polícias; é de aplicação obrigatória, sempre que alguém for constituído
como arguido, e consiste, para além da identificação do arguido e da
indicação da sua residência, em o arguido ficar obrigado a comparecer
perante as autoridades sempre que a lei o obrigar ou para tal for
notificado; o arguido fica igualmente obrigado a não mudar de residência
nem dela se ausentar por mais de cinco dias sem comunicar a nova
residência ou o lugar onde possa ser encontrado.
Em que consiste a caução?
R: A caução, enquanto medida de coacção,
consiste no depósito, penhor, hipoteca ou fiança, bancária ou não, do
montante que for fixado e pode ser aplicada pelo tribunal em processo
penal a arguido da prática de crime punível com pena de prisão.
O que é a obrigação de permanência na
habitação?
R: É uma medida de coacção que se traduz no
dever de o arguido não se ausentar, ou de não se ausentar sem
autorização, da habitação própria ou de outra em que de momento resida.
Em que consiste a vigilância
electrónica?
R: Trata-se da utilização de meios técnicos de
controlo à distância - as chamadas pulseiras electrónicas - para
assegurar a fiscalização do cumprimento da medida de coacção obrigação
de permanência na habitação.
O que é a prisão preventiva?
R: É a mais grave das medidas de coacção
aplicáveis ao suspeito da prática de crime, só sendo aplicável quando
forem inadequadas ou insuficientes todas as outras medidas de coacção.
Qual é o prazo máximo da prisão
preventiva?
R: Em regra, a prisão preventiva extingue-se
quando, desde o seu início, tiverem decorrido: quatro meses sem que
tenha sido deduzida acusação; oito meses sem que, havendo lugar a
instrução, tenha sido proferida decisão instrutória; um ano e dois meses
sem que tenha havido condenação em 1ª instância; um ano e seis meses sem
que tenha havido condenação com trânsito em julgado.
Como ofendido sou informado da
libertação do arguido preso preventivamente?
R: Quando considerar que a libertação do
arguido pode criar perigo para o ofendido, o tribunal informa-o da data
em que a libertação terá lugar.
Fui notificado para ser inquirido como
testemunha no âmbito de um inquérito. Pode-me ser aplicada alguma medida
de coacção?
R: Não. As medidas de coacção apenas podem ser
aplicadas aos suspeitos da prática do crime previamente constituídos
como arguidos.
Em que consiste a acusação?
R: É uma forma de encerramento do inquérito
criminal que se traduz pela submissão do arguido a julgamento pela
prática de determinados crimes; em regra, é realizada pelo Ministério
Público (MP), mas também pode ser levada a cabo pelo assistente quando
estiverem em causa crimes particulares.
O que é o arquivamento?
R: Outra forma de encerramento do inquérito e
que se traduz na não submissão do arguido a julgamento, dado que não
foram recolhidos indícios suficientes sobre a prática de um crime por
certo(s) agente(s).
Em que consiste a suspensão provisória
do processo?
R: É a possibilidade de encerramento do
processo respeitante a crimes pouco graves pela simples submissão a
regras de comportamento ou injunções durante um determinado período de
tempo; pressupõe o acordo da vítima.
Sou assistente e fui notificado do
arquivamento do inquérito. O que posso fazer?
R: O assistente, obrigatoriamente assistido por
advogado, pode requerer a abertura da instrução, fazendo assim intervir
um juiz de instrução que vai fiscalizar o acerto da decisão de
arquivamento.
Em que consiste a noção de flagrante
delito?
R: É o momento em que o agente é surpreendido a
cometer um crime que está a ser praticado, que acabou de o ser, ou o
caso em que o agente for, logo após o crime, perseguido por qualquer
pessoa ou encontrado com objectos ou sinais que mostrem claramente que
acabou de o cometer ou nele participou
O que é o segredo de justiça?
R: O segredo de justiça significa que aquilo
que consta do processo não pode ser divulgado nem o público pode
assistir aos actos processuais. Porém, a regra é a de que o processo é
público em todas as suas fases, quer relativamente aos sujeitos
processuais (publicidade interna) quer para o público em geral
(publicidade externa) o que implica: assistência pelo público à
realização dos actos processuais; narração dos actos processuais pelos
meios de comunicação social e consulta do processo e obtenção de cópias
e certidões de quaisquer partes dele. Pode contudo o Juiz de Instrução,
a requerimento do arguido, assistente ou ofendido e ouvido o Ministério
Público, restringir a publicidade externa, determinando a sujeição do
processo, durante a fase de inquérito, a segredo de justiça. Nestes
casos em que tiver sido determinado o segredo de justiça pode o
Ministério Público, durante o inquérito, opor-se à consulta de auto,
obtenção de certidão e/ou informação por sujeitos processuais. A
violação do segredo de justiça constitui crime.
AJ
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